sábado, 28 de fevereiro de 2009

A Batalha

O frio batia ao pano da minha tenda
A mão implacável e enluvada insistia na carícia gelada
Os seus cristais entrando cada vez mais na carne
E o gosto salgado na boca amargava a paisagem pela abertura da tenda

Mais tarde, o caminho envolto em brumas, e gemidos, e lamentos
Marcava sob as patas dos cavalos e as rodas de carruagens
O peso das armaduras, umbrais, e ginetes em riste

Enquanto a névoa se dissipava, o campo aberto à frente se mostrava
E as legiões assustadas, famintas e cansadas da noite fira
Se espremiam entre as lanças dos seus próprios tenentes
E o vapor quente e ofegante dos nossos cavalos

Em instantes foi como se o céu se abrisse
O chão tremesse
E a terra lamentasse

A mão dura e áspera do frio deu lugar à uma onda de calor sem sentido
Do ódio misturado à coragem
Do medo, incerteza, ilusão
Da dúvida...

O que os impele ao balido metálico das espadas nos ossos?
As poças de água do orvalho se tornando vermelhas, mornas,
O som mistura a alvorada com o crepúsculo
E o ar se enche do cheiro da morte

De repente o meu peito arde e as costas em brasa me tiram as forças
Meu Deus
De onde vem esta chama metálica que me arrebata?
O ruído ensurdecedor parece se desvanecer no ar
E a batalha fica suspensa, inanimada
Flutuo no ar e vejo abaixo meu próprio semblante
Sem vida, sem dor, sem ruído

Me sinto leve, meus atos se discurtinam à minha frente,
O medo do nascimento, O seio da mãe, A voz grave do pai
A dor de crescer, agora tão rápido
O prazer que conheci furtivamente com as vassalas nos campos de feno
A primeira briga, e o nariz quebrado
Meu casamento, meus filhos, meu reino

Sim meu Reino, fui Rei, fui Rei
As batalhas vitoriosas, meus atos e minhas ordens implacáveis,
O perdão e a misericórdia tantas vezes negados

Agora sei o que me espera
Por meus atos serei julgado,
Não pelos atos de minha mão ou de minha pena,
Mas pelos atos do meu coração.
Amei e pequei, e agora os dois serão pesados diante de mim.
Já ouço de um lado o clamor das ninfas e suas harpas
E de outro os gemidos eternos do Hades

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