segunda-feira, 21 de outubro de 2013

O eterno paradoxo da justificativa da vanguarda



O eterno paradoxo da justificativa da vanguarda, 
ou livre reflexão sobre uma história contada durante um show da dupla de violonistas “Duofel”.

Conta a dupla que lá pelos seus dez anos de carreira (me perdoem a imprecisão dos fatos se não for essa a data correta), depois de longos anos de carreira, ainda sem alcançar o pleno sucesso almejado, ouviram certa feita do presidente de uma grande gravadora, que sua música era refinadíssima, sua técnica muito apurada e que lhe havia agradado muito mesmo, porém para ter aprovação do grande público, e entrar para o circuito das grandes gravadoras, eles precisavam tocar musicas de outros autores mais conhecidos, para que só então o grande público pudesse  “entender” a música tão original e apurada da dupla.

Imediatamente a história me remeteu à transição entre os séculos XIX e XX, nos salões de Paris, onde artistas esboçavam com ousadia as primeiras experiências da arte abstrata, notadamente Piet Mondrian, Vassily Kandinski e Casemir Malevich.  Naquela altura, hostilizados pelos críticos e pelo grande público e adorados pelos intelectuais da época, tiverem que demonstrar sua proficiência nas técnicas da academia, e demonstrar todo o caminho de desconstrução do figurativo, para só então justificarem seu caminho ao abstracionismo. Como se a genialidade e a sensibilidade tivessem que se render ao caminho árduo da técnica mais apurada para adquiri o “direito a se libertar”.

O mesmo ocorre também com o pensamento humano, por isso prefiro classificar minhas ideias como livres reflexões. Para obter a legitimidade acadêmica, é preciso mostrar o encadeamento do raciocínio de quem pensa à toda a evolução histórica do pensamento humano, como se fosse absolutamente necessário situar as ideias na linha do tempo e justificar sua legitimidade por sua originalidade e ao mesmo tempo pelo senso de continuidade do que foi pensado antes.

Reconheço o valor do encadeamento histórico que nos revela a evolução do pensamento, que situa cada ideia em seu contexto histórico e mede seu impacto aos seus contemporâneos, e como antecipou tendências e comportamentos... ou seja, servindo até de medida para a genialidade, originalidade a e capacidade visionária de alguns dos pensadores.

Mas acredito que hoje temos a liberdade de produzir o abstrato, o conceitual, o pós-moderno, simplesmente nos apropriando livremente das experiências e ícones passados, e as relendo para criar o novo, sem ter que reproduzir toda a história da arte nos cadernos de esboço.

Sem a pretensão de achar que algum dia serei comparado aos meus contemporâneos, ou mesmo que minhas parcas ideias serão situadas na linha do tempo da nossa evolução, rotulo sempre meus escritos como “livre reflexão”, assim na abstenho do peso de justificar qualquer  legitimidade.

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